O governo quer reduzir as despesas com aposentadorias por invalidez e estuda fixar uma meta de corte de 40% na quantidade de benefícios até 2019. Para alcançar essa meta, está elaborando um plano de reabilitação dos segurados, tanto do ponto de vista da saúde quanto da profissão, que permita a reinserção dos profissionais no mercado de trabalho. De acordo com estimativas da Previdência, a medida levará a uma economia de R$ 25 bilhões por ano, quando todo o sistema estiver funcionando.
Neste domingo, O GLOBO noticiou que, sem uma reforma na Previdência, os gastos só com o pagamento de aposentadorias públicas vão consumir 46% do PIB em 2030. O percentual hoje é de 18,7%. As projeções levam em conta o envelhecimento da população, que ocorre em ritmo mais intenso que o previsto.
Em relação às aposentadorias por invalidez, o cálculo do governo inclui, além dos gastos com trabalhadores da iniciativa privada, os funcionários públicos e ações específicas na concessão de auxílio-doença por prazos mais longos, entre quatro e seis meses.
Dados da Previdência mostram que o gasto com trabalhadores afastados definitivamente do serviço em função de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais mais que quadruplicaram entre 2002 e 2011, de R$ 8,2 bilhões para R$ 34,8 bilhões. As concessões de aposentadorias subiram quase 30%, de 2,4 milhões para 3,1 milhões, no mesmo período. E as despesas com auxílio-doença aumentaram de R$ 5,4 bilhões em 2002 para R$ 18,1 bilhões em 2011.
Um grupo de trabalho formado pelos Ministérios da Previdência, Saúde, Planejamento e Trabalho tem até 10 de janeiro para concluir o projeto, que será apresentado à presidente Dilma Rousseff. Na prática, a proposta é fazer uma triagem no universo dos aposentados por invalidez para verificar a possibilidade de reabilitação, com doação de próteses, por exemplo, e encaminhamento a curso de qualificação e treinamento para inserção no mercado.
"Todos ganham com política de reabilitação"
Quem der entrada a pedido de auxílio-doença também será reavaliado dentro da perspectiva de troca de função, caso a previsão seja de afastamento prolongado. A proposta prevê integração dos ministérios com o setor privado, via sistema "S", e a inclusão do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), que reserva 5% das vagas para deficientes.
A legislação atual já prevê revisão das aposentadorias por invalidez a cada dois anos, mas dificuldades na implantação de um sistema de reabilitação e falta de entrosamento entre órgãos públicos dificultam o cumprimento da exigência. Desta vez, segundo o secretário de Previdência Social, Leonardo Rolim, há disposição de pôr em prática uma política de reabilitação e de fazer controle mais rigoroso dos benefícios.
"Estamos trabalhando numa proposta concreta para reabilitar os trabalhadores e reduzir os gastos com aposentadoria por invalidez".
Segundo ele, as aposentadorias por invalidez no Brasil representam 18% do total de afastamentos definitivos pagos pelo INSS, e a ideia é reduzir essa proporção para 10%, patamar semelhante ao de países que executam políticas de reabilitação, como Espanha e Holanda.
Para o gerente-executivo de Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Emerson Casali, a falta de um programa de reabilitação leva ao aumento de custos, tanto para a Previdência quanto para as empresas e para os próprios trabalhadores.
"Todos ganham com uma política de reabilitação", afirma Casali.
Para João Barbosa, diretor do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção e do Mobiliário de Brasília, a proposta do governo será mais uma forma de negar o direito dos trabalhadores. Ele disse que hoje, quando sofrem um acidente relacionado à ocupação, os funcionários do setor de construção têm dificuldade para conseguir atendimento na perícia do INSS.
"A perícia tem negado benefício até mesmo para quem está em cadeira de rodas. O governo tem é de investir em segurança, contratar mais auditores e aumentar a fiscalização de obras irregulares para evitar acidentes" opinou.
Há nove anos, depois de ser diagnosticado com lesão por esforço repetitivo (LER), Francisco Rubens Pereira, de 59 anos, precisou parar de trabalhar na plataforma de engarrafamento de uma companhia de gás natural. Até conseguir a aposentadoria, no entanto, passou dois anos e seis meses afastado, entre idas e vindas aos hospitais para comprovar a doença por meio de exames. Para ele, se não pode atuar numa área, o profissional não deve ser realocado em outra.
"Se o trabalhador se machuca, alguém tem de se responsabilizar por ele", disse Pereira.
Trabalhador da área de construção civil, Luciano de Souza Lobato, de 35 anos, está em seu terceiro atestado médico. Com uma jornada de pelo menos oito horas por dia quebrando concreto, Lobato tem sentido dores frequentes nos punhos e está numa queda de braço com a companhia onde trabalha para que ela emita a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) e, com isso, ele tenha atendimento mais rápido na Previdência. A seu ver, é positiva a criação de uma política para reabilitar os profissionais, mas, antes disso, deve haver menos burocracia no atendimento ao cidadão.
" Nos hospitais, os médicos falaram para eu mudar de função. Mas, como não quer reconhecer que tive um acidente de trabalho, a médica da empresa disse que eu deveria atuar em um "serviço restrito". Então, faço outras atividades, mas fico mal visto na firma", relatou Lobato.
Paulo Eduardo dos Santos, de 50 anos, por sua vez, deixou há dois anos o seu posto de homologador de rescisão contratual em um sindicato, devido a um problema renal crônico. Ele disse que, no seu caso, não seria possível exercer outra função, devido a inchaços, tonturas e dores frequentes, mas considerou que a proposta é positiva, desde que o governo melhore o atendimento à saúde prestado aos trabalhadores.
"O desafio é o governo efetivamente buscar recolocar essas pessoas no mercado e melhorar a estrutura de saúde oferecida", ponderou.
Coordenador do Programa de Readaptação Profissional da Prefeitura de Piracicaba (SP), o médico Rubens Motta calculou que, desde 2005, pelo menos cem pessoas passaram pela capacitação e não precisaram se desligar do serviço público. Há casos de professores que, por depressão ou outra doença, foram transferidos para outros ramos na educação.
"São pessoas que estariam aposentadas, mas que podem desempenhar outras atividades. No início, pode haver resistência, mas depois percebemos que é bom para valorizar as pessoas, que se sentem mais seguras".
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